04 junho 2012

SUÍÇA: CAÇANDO TESOUROS NO MERCADO DE RESÍDUOS - Clare O'Dea

Demolição de uma casa na Suíça. (Keystone)

Cada habitante da Suíça produziu 707 quilos de resíduos urbanos em 2010, um número 40% acima da média europeia. Porém graças a um sistema modelo de eliminação e sistemas de reciclagem, lidar com lixo se tornou um bom negócio.

Existe uma demanda para todos os tipos de material reciclável, incluindo entulho de construções até estrume de elefante. O que importa é saber se a sua remoção de um lugar para outro é uma atividade rentável.

Com 650 empresas ativas no setor, cresce a competição para aproveitar o bolo de 20 milhões de toneladas de material utilizado que troca de mãos na Suíça a cada ano.

Uma empresa suíça - abfallboerse.ch (bolsa de lixo) - encontrou um nicho de mercado ao oferecer uma plataforma de negócios entre aqueles que geram e eliminam resíduos. Informações sobre as pessoas interessadas em jogar algo fora são confidenciais, como explica o fundador da companhia, Kurt Muther, à swissinfo.ch.

"Baseado nos resíduos que uma empresa está produzindo, especialistas na indústria podem realizar estimativas acuradas sobre a produção, o que pode ser uma informação muito sensível", explica Muther.

"Afora material radioativo, nós podemos negociar com todas as categorias de resíduos, incluindo pepelão, papel, plásticos, metais, sucata, lixo hospitalar, lixo orgânico, entulho de construção civil, resíduos líquidos e madeira."

Valor agregado 

"Lixo orgânico, como esterco, é uma categoria que passou do lado do débito para o do crédito no balanço geral", acrescenta Muther. "O esterco é muito procurado pelos produtores de húmus ou usinas a gás". A plataforma abfallborse.ch na internet, que representa os produtores de resíduos, vasculha o mercado e obtém o melhor preço para os resíduos, se há também um custo ou ganho para a sua remoção.

"A concorrência está funcionando bem na Suíça, com algumas diferenças regionais, especialmente na parte francófona da Suíça, onde a falta de concorrência faz com que os preços da eliminação de lixo sejam 20% mais elevados", diz. "Temos números confiáveis de que, no momento, mais de 20 milhões de toneladas de lixo são despejados nas ruas da Suíça a cada ano. Se você coloca um preço de mercado nos custos de transporte e eliminação desse volume de lixo, sem incluir a disponibilização de toda a infraestrutura, você chega a um potencial de mercado de 2,8 bilhões de francos suíços", acrescenta.

Trabalho pesado 

Somente o setor de construção civil responde sozinho por mais de dois terços do volume de lixo na Suíça. A boa notícia é que 80% desse material são reciclados, em grande parte para virar concreto. A taxa europeia é de 46%.

O Ministério suíço do Meio Ambiente tem um papel fundamental na elevação das taxas de reciclagem no setor da construção civil e demolição na última década.

A força do sistema helvético de gestão de resíduos está no fato da legislação ser baseado em consulta. "Como resultado, ela é bastante equilibrada e permite também sua aplicação de forma eficiente", afirma Robin Quartier, funcionário no ministério.

Um regulamento importante é a exigência de separar os materiais no local de demolição. "Na Suíça você não pode simplesmente derrubar um prédio, criar uma pilha enorme de entulho e despejar no aterro mais próximo. Você tem de separar os resíduos da demolição que são combustíveis e não combustíveis", explica.

As construtoras também têm um grande incentivo para despejar o menos possível de material nos aterros, pois os encargos são relativamente elevados. Fragmentos de concreto podem ser triturados de forma eficiente e utilizados para a fabricação de concreto novo. As autoridades concentraram seus esforços nos últimos dez anos para criar uma demanda para esses tipos de materiais reciclados. 

"Construir com materiais reciclados já é tecnicamente possível há muito tempo, mas as pessoas que estão construindo uma casa ou algo parecido preferem escolher materiais novos. Havia muito trabalho a ser feito como introduzir normas técnicas para engenheiros que trabalham com esse tipo de material e facilitar o acesso ao mercado", lembra Quartier.

Questão importante 

Uma das leis em vigor desde 1° de janeiro de 2000 é a proibição de depósito de lixo combustível nas áreas de aterro. A Suíça regulamenta que se este pode ser queimado, ele tem de ser queimado. Agora 50% de todo o lixo urbano é levado aos 29 incineradores em funcionamento no país, enquanto que o resto é analisado, coletado separadamente e reciclado.

De acordo com as autoridades ambientais, a incineração ajuda a reduzir as emissões poluentes e preservar os recursos naturais. O volume de lixo foi reduzido dessa forma a 90%.

Os incineradores, que são propriedade e geridos pelas administrações cantonais (estaduais) ou comunais (municípios), são aceitos como parte da paisagem pela população, apesar da resistência por eles em outros países como a França e a Irlanda.

Todas as usinas estão equipadas com filtros eletrostáticos, capazes de filtrar cinzas e poeira. A maior parte das cinzas coletadas pelos filtros é tratada na Suíça e o resto é enviado à Alemanha, onde é armazenado com segurança em minas de sal desativadas especialmente equipados para esses fins. 

Entre as fronteiras

Em 2010, a Suíça exportou 214 mil toneladas de resíduos perigosos, 12% do total. No mesmo ano a Suíça importou aproximadamente 31 mil toneladas de lixo nessa categoria.

A Suíça apresentou um pedido de adesão à Rede Europeia para a implementação e aplicação da legislação ambiental vigente (IMPEL, na sigla em inglês). Um dos benefícios será de "coordenar e resolver problemas no movimento transfronteiriços de lixo."


A gestão de resíduos é um negócio global e grandes multinacionais como Veolia, Loacker Recycling ou Remondis também estão presentes na Suíça. De acordo com Muther elas estão comprando empresas locais médias na área de eliminação de detritos. "Essa é a estratégia correta, pois o conhecimento local é essencial", diz. Com o elo final da cadeia de lixo bem regulada e administrada, a atenção da classe política está voltada agora para formas de reduzir o impacto ambiental de bens e serviços utilizados pela população suíça.

No entanto, ainda há um grande caminho para o país alcançar a sustentabilidade. Em um recente relatório, a organização mundial de defesa do ambiente WWF estimou que se o resto do mundo viver de uma forma similar a dos suíços, 2,82 planetas serão necessários para suportar o consumo global.

Extraído do sítio Swissinfo.ch

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